Quatro... cinco ... seis . Chove. Estranhamente o grande número de pessoas não se movimenta. Estão todos ali, parados, olhares incrédulos, aturdidos, chocados.
Onze... doze. Meu olhar vagueia pelos semblantes, meu pensamento alça vôo. Lembranças ocupam agora o lugar das fisionomias.
Dezesseis.. dezessete. Lembro-me do primeiro choro, da primeira vez que o fitei. Da sensação inexplicável de que algo não estava como deveria estar. Das percepções sem razão aparente que, de repente, foram confirmadas.
Vinte e um... vinte e dois. As pessoas se aproximam lentamente, falam o que não ouço, e se vão. Minha mente continua a viajar. Primeiro o vôo objetivo, depois todos os outros que se seguiram por infindáveis dias e, principalmente noites.
Vinte e nove... trinta. O primeiro sorriso, a primeira esperança. O início de uma jornada repleta de inúmeros : “Não sei”; “Nunca vi”; “ É a primeira vez que me deparo com algo assim”.
Trinta e cinco... trinta e seis. O olhar seguindo as luzes da árvore de Natal e minha constatação feita entre lágrimas: Sim, ele enxerga. O Natal que terminou no hospital. Rima mais besta, tão besta quanto a própria situação de não querer rimar, tão besta quanto a falta de rima da própria situação.
Trinta e nove... quarenta. Foi dada a largada da corrida contra o tempo. Dia e noite tornaram-se uma só coisa: uma tentativa desesperada de sobrevivência.
Quarenta e seis... quarenta e sete... quarenta e oito. O trabalhador se afasta. Está terminado.
Somos apenas eu, o braço nos meus ombros e o buraco, agora lacrado, a minha frente.
Dou-me conta de que minhas roupas estão secas. Chovia somente dentro de mim.
Viro e sigo o caminho, minha única opção.
Adeus, meu filho!
3 comentários:
Por trás das palavras, o seu sentir. Impressionante a maneira com que suas palavras dão significado a sentimentos. E nos levam até eles num dialeto que só o coração conhece.Inexplicável, porém, claro feito água pura.
Este seu texto me fez lembrar certas passagens de minha vida. Seu estilo é muito bom.
Me desculpa...
Estive ali te olhando...
Uma lagrima...
Mas não pude te abraçar...
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