
Se hoje em dia toda menina sonha com uma Barbie, na minha infância todas desejávamos uma Susie. Naquele tempo não havia a quantidade de apetrechos que hoje são acompanhamentos obrigatórios ( o namorado, o carro, a casa, etc). Bastava-nos a boneca e as roupas.
As roupas exerciam um fascínio impressionante sobre nós, pois nos permitiam transformá-las ( e a nós mesmas, por tabela), numa infinidade de personagens deslumbrantes. Como a variedade disponível para compra não era tão grande ( como também não eram os recursos para sua aquisição), passávamos tardes sem fim elaborando os mais belos modelos. Talvez nenhum deles passasse pelo crivo de Alexandre Herkovich mas, para nós, eram preciosidades incomparáveis. Além do mais, possuíamos uma fonte inesgotável de fornecimento de matéria prima: Tia Zilda, a melhor costureira que conheci até hoje.
A vida era, naquela época, de uma simplicidade absurda. Tudo o que se esperava de nós era que freqüentássemos a escola, fizéssemos o dever de casa e pronto. Liberdade total para ser o que éramos: crianças sequiosas por aventuras, por descobrir o mundo, por explorar todas as possibilidades de aprendizagem e brincadeiras.
Uma das mais marcantes lembranças daquela época foi resultante, digamos, da “coalizão” do que eu dizia acima. Minha irmã mais nova estava encantada com algo que aprendera na escola: um belo feijãozinho, se colocado num algodão umedecido, brotava e segundo a professora, se plantado, daria muitos outros feijões. Ela observava encantada a sementinha transformar-se em raminho, abrir folhinhas. Para nós, que já havíamos plantado nossos feijões, aquilo já não apresentava a menor graça, de forma que não prestamos a menor atenção, nem a ela, nem ao incauto feijão do qual ela cuidava com tanto desvelo.
E o feijão teria passado em branco, como certamente passaram milhões de feijões ao longo da vida estudantil de crianças de todo o mundo, se um dia não a tivéssemos encontrado, aos prantos, sentada no quintal, ao lado de uma quantidade considerável de montinhos de terra, dizendo que não havia brotado. Perfidamente, como só as crianças são capazes de fazer, ficamos inquirindo-a. Afinal, qual era o motivo de tamanha tristeza? Enquanto um lado nosso estava curioso, o outro aguardava ansiosamente o momento de desatar a rir. Afinal, ela era nosso alvo freqüente.
No entanto, daquela vez, o fato relatado fez com que nós todas chorássemos, menos por solidariedade e mais numa mistura de tristeza, indignação e raiva. Minha tão caprichosa irmã plantara, no intuito de nos surpreender, todas as roupinhas de Susie.
T O D A S !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Não brotaram, claro. Na verdade, a totalidade delas não pode ser salva.
Apesar das gargalhadas que hoje a história ainda rende, penso que duas lições aprendi com isso tudo. A primeira é que nunca, mas nunca mesmo, devo subestimar uma irmã mais nova, por mais inofensiva que ela possa parecer. A segunda é que, por mais tentada que me veja a continuar regando e cuidando de sementes, tenho que estar atenta, pois roupas de Susie tem o péssimo costume de não brotar.
Não brotaram, claro. Na verdade, a totalidade delas não pode ser salva.
Apesar das gargalhadas que hoje a história ainda rende, penso que duas lições aprendi com isso tudo. A primeira é que nunca, mas nunca mesmo, devo subestimar uma irmã mais nova, por mais inofensiva que ela possa parecer. A segunda é que, por mais tentada que me veja a continuar regando e cuidando de sementes, tenho que estar atenta, pois roupas de Susie tem o péssimo costume de não brotar.
Crédito de imagem: Brites dos Santos